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quinta-feira, junho 21, 2007

Blues Is the Teacher, Punk Is the Preacher!

Lisa Kekaula e seu Bellrays: a hora e meia mais concorrida do festival
Fotos deste post: Porão do Rock


No começo do mês o Porão do Rock, festival dos mais saudáveis do novo rock brasileiro, tomou de assalto os holofotes do nosso circuito independente. Com atrações do porte do Bellrays, Sepultura e Mudhoney – além de alguns dos filhos mais interessantes dessa efervescência musical toda, como Macaco Bong e Superguidis –, comemorou seus primeiros dez anos de existência tirando onda de gente grande. Vem comigo que eu te conto:


We Feel Like A Bullet



Debaixo do emaranhado de barras de ferro que davam sustentação à enorme estrutura situada entre os dois palcos e que, piso acima, abrigava a área vip da décima edição do Porão do Rock, uma dúzia de pessoas falavam alto, empolgadas pela cerveja e por papos que tentavam investigar os caminhos do rock independente nacional. Procuravam descobrir, entre um gole e outro, como as coisas vão estar daqui alguns poucos anos. O Ulisses Xavier, da produção do festival e vocalista da Plástika distribuía cartõezinhos Coolnex, que continham uma raspadinha que dava direito à downloads gratuitos, tanto da Plástika quanto de bandas do line-up do festival.

Lá em cima na área vip – games de guitarra, bar bombado e arquibancadas nas laterais dos palcos –, a fauna esquisita do pop nacional desfilava orgulhosa. Do lado de lá, milhares de humanos fantasiados percorriam incansáveis o asfalto frio do estacionamento do estádio Mané Garrincha, indo dos palcos para a praça de alimentação e chegando, por fim, na tenda, que exibia uma escalação com DJs de todos os tipos: quase tudo escapava das caixas de som, de Slayer à Amy Winehouse, sem constrangimentos.

Nos palcos, uma penca de bandas já havia se apresentado, começando pelo punk operário e comunista dos Garotos Podres, seguidos pelo Allface. Perdi o Linha de Frente, banda local de hardcore Vegan (aqueles radicais do No flesh, No Drugs...) malvadão, que tocou antes do Galinha Preta (um dos melhores shows do último Bananada) e dos Mechanics.




Dance of Days: Bizarrice emo


O Dance of Days é uma piada bizarra pra lá de longeva, deve-se admitir, e como era de se esperar, a molecada comprou satisfeita a exibição de Nenê Altro e companhia. Após o show, adolescentes maquiados disputavam poses ao lado do, err, “ídolo”, diante dos flashes dos amigos.

Depois de uma visita à barraca da pizza e uma esticada no quiosque da pepsi (!), fui espiar os argentinos do Satan Dealers, que são bem melhores do que os portugueses incensados do Born a Lion, que ocupariam o palco daí a pouco. O Satan Dealers já dividiu um vinilzinho colorido de 7” com o MqN, intitulado We Feel Like A Bullet, e sua receita bem temperada de MC5 com Motorhead funciona muito bem, daqui a pouco até a Ana Maria Braga copia.

O Zamaster, a despeito de ser uma das bandas fundadoras do Porão do Rock, é uma anedota teen, tardia e desnecessária, e a também brasiliense Harllequin enumera arrogante todos aqueles clichês caricatos do heavy metal, magistralmente representados pelo Massacration.

Anunciados como a sensação do folk metal mineiro (!!!), o Tuatha de Danann apareceu com uma mistura inusitada de heavy metal comportado, fundido sob performance hippie. Flautas e batas coloridas em “harmonia” com guitarras e climas épicos, cheios de pretensão celta. Incrivelmente a multidão disforme gostou bastante. Eu não entendo mais nada...

Depois de tamanha demonstração de paciência e tolerância, me concedi o direito de não me aproximar da arena durante o show do Angra, e fui encontrar os amigos para a última pepsi da noite.


“I Dont Care Where You Come From”




Havíamos acabado de chegar à Brasília, eu e o Ulisses Henrique, e paramos num dos milhares de shoppings da cidade para comer. Entramos e de pronto encontramos, por acaso, o Bruno Kayapi, guitarrista do Macaco Bong e bróder desde o último Demo-Sul, festival que acontece sempre no segundo semestre lá em Londrina, no Paraná.

Na saída do shopping o carro do Ulisses apaga e resolve não mais responder, e eis que sobra pra mim e pro Kayapi a ingrata tarefa de empurrar a Parati morta até o mecânico mais próximo, coisa que não tínhamos a mínima idéia de onde seria. Eram quase quatro da tarde e o sol ainda ardia seco no horizonte da capital.

Vinte e quatro horas depois, estávamos todos no mesmíssimo shopping, dessa vez sem preocupações imprevistas e almoçando com voracidade. Era o intervalo das reuniões da ABRAFIN (Associação Brasileira de Festivais Independentes), e muita gente boa devorava fast food como se fosse a comida da mamãe: Anderson Foca (DoSol - RN), Fabrício Nobre (Monstro/MqN – GO ), Pablo Kossa (Fósforo Rec - GO), Gustavo Sá (Porão do Rock - DF), Ney Hugo (Espaço Cubo/Macaco Bong - MT), Dewis Caldas e Ahmad (Volume/Espaço Cubo -MT), além de alguns jornalistas e blogueiros. Daí a pouco a maratona final dos debates nesse aniversário de 10 anos do Porão iria recomeçar.

Pouco depois que o sol se escondeu no horizonte plano e azul de Brasília, a Lafusa plugou sua bossa-pop para quase ninguém, antes de o Macaco Bong ocupar o palco ao lado e, apesar do pouco público, ostentar sua música poderosa e envolvente, ajuntando no gargalo da área vip, opiniões importantes do jornalismo nacional. Jamari França, crítico d’O Globo e editor do Jam Sessions – Blog do Jama, assistiu tudo, e depois, na coletiva de imprensa do trio instrumental, fez questão de sacar seu bloquinho de anotações e ir falar com o pessoal.

Aproveitei o show do Rock Rocket para jogar meia hora de conversa fora, antes de voltar à arena para acompanhar o Superguidis, que lança o segundo disco ainda esse ano, pelo selo candango Senhor F. Cheios de fãs na cidade, o grupo gaúcho é mesmo um daqueles fenômenos discretos que começam a pulular nos quatro cantos do país. No caso deles, dá pra pensar que antecipam o vindouro revival dos anos 90, que já deve estar se remexendo e pronto para romper a superfície frágil dessa febre anos 80 que nos assombra já há alguns anos.

Depois do Cromonato (que fez sucesso com sua igrejinha) e da Vamoz! (ainda não arranjaram um baixista?), o Moptop colheu mais uma vez os louros de banda “grande”. Menininhas lascivas se aglomerando na grade, garotos cantando junto, e alguma histeria. É impressão minha, ou eles estão mesmo cada vez menos parecidos com os Strokes? Os cariocas tem show marcado ao lado do Hurtmold e da britânica Magic Numbers, no Rio e em São Paulo, dentro da programação do Conexão Indie-Rock Festival.

Depois da indecisão estilística do Supergalo, o Móveis Coloniais de Acajú injetou delírio na massa compactada e saltitante. A big-band brasiliense também compõe o line up do Conexão Indie e tem show marcado ao lado do Mombojó e dos ingleses do The Rakes, dia 26/06 no Rio e 27 em São Paulo.

Chegando à apoteose da noite, o quarteto mais cool do festival subiu no palco e num desfile louco, Lisa Kekaula (que já foi vocal de apoio do Basement Jaxx) e seu Bellrays fizeram a apresentação mais impressionante de toda a festa. Priorizando as flechadas certeiras do último e ótimo Have A Little Faith, a negra gorda e dona do maior black power que já eu vi, se transformou em musa da multidão, que estampava um sorrisão no rosto e movimento frenético e ritmado nos quadris. O êxtase foi tamanho que Lisa desceu do palco e confraternizou com o pessoal de cima da base dos fotógrafos, num flagrante captado pelo bróder e companheiro de viagem Ulisses Henrique. Aperte o play:


A Nação Zumbi teve a tarefa de suceder o combo punk/soul californiano e, como era de se esperar, não decepcionou. Que a cozinha do grupo pernambucano descobriu um jeito único de groovear, todo mundo já sabe, mas a cada apresentação que vejo do septeto pernambucano, me convenço ainda mais de que eles vivem seu auge artístico agora, ao contrário do que sugere o lugar comum de maioria da crítica, que relega esse título ao passado de explosão midiática da era Chico Science. Talvez por que até hoje os momentos de maior comoção sejam em Maracatu Atômico e Da Lama ao Caos, clássicos absolutos, e um tanto desgastados, do pop noventista brasileiro.



So, shake your head, sucker!

Seguindo, o Sepultura apresentou seu novo baterista para o público do meio oeste brasileiro. Jean Dolabella, que abandonou as baquetas do Udora na véspera do fim vergonhoso a que parece estar fadado o grupo mineiro, não deveu nada à performance superlativa de Iggor Cavalera, mesmo por que se manteve fidelíssimo ao que o antigo titular do posto que agora ocupa fazia. Aparentemente não quis correr o risco de bater de frente com os fãs xiitas da banda.

Hinos remotos como Troops of Doom e Inner Self, dividiram atenções com clássicos como Refuse/Resist e com o cover de Bullet the Blue Sky, do U2, presente no track list de Revolusongs, mas o arrebatamento se deu mesmo foi na matadora seqüência final, que enfileirou Territory, Arise e Roots, Bloody Roots. Não sobrou pedra sobre pedra, nem costelas no lugar.


Ninguém se importa Mark, ninguém!

Depois da destruição do Sepultura, os “tios” do grunge ocuparam o palco ao lado. Mesmo na ingrata posição de headliner pós-Sepultura, o Mudhoney (foto) conseguiu arrebanhar as camisas xadrez, os tênis surrados e óculos de massinha, e os agrupar na frente do palco, o que não somou mais do que quinhentas almas atenciosas e regozijantes.

Ainda assim, Mark Arm e sua turma não não se intimidaram e perfilaram seus hits mais esporrentos. Suck Your Dry e Touch Me, I’m Sick foram comemoradas intensamente pelos indies de plantão, antes da banda cancelar a coletiva de imprensa marcada para depois do show.Pra terminar, Mark Arm soltou essa, em agradecimento:


Thank You Brasília... or Goiânia. I dont care where you come from!”.


É mole?

E depois ainda dizem por aí que Goiânia não é Rock City.


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