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sexta-feira, julho 23, 2010

Samba no pé tem cura

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Quem mora em Goiânia e se interessa por música ao ponto de prestar atenção ao redor provavelmente já ouviu a Grace Carvalho, seja nas tardes de sábado e domingo no Glória – onde costuma desfilar seu repertório de standards pinçados no primeiro escalão do samba –, seja à frente do Pedra 70 - banda que é uma espécie de fôlego atávico do pop psicodélico nacional dos anos 60 e 70, onde recria gemas, por exemplo, d’Os Mutantes, Roberto Carlos, Gal Costa e Novos Baianos.




Estabelecida como a principal intérprete de samba da cidade ao mesmo tempo em que acumulava elogios derramados às sempre intensas apresentações do Pedra 70, Grace ferveu seu potencial criativo em fogo brando durante quase 10 anos, enxergando-se como compositora ainda antes de assinar a autoria de qualquer canção.

Depois de uma temporada na Europa, onde se apresentou em clubinhos de Paris e Barcelona, voltou ao Brasil decidida a parir ela mesma o repertório de sua première. Como única exceção, pescou “Navegador”, canção dos irmãos Bruno Bonfá e Fabius Augustus (mais conhecidos como Brunaite e Smooth), dupla de criação de um dos grupos decanos do rock local, o Vícios da Era, e substituiu a delicadeza acústica e masculina da versão original por uma saborosa reedição trip hop, sinuosa, nublada e absolutamente feminina.




Como autora de primeira viagem, Grace se divide entre o suingue contemporâneo de “Samba Branco” (onde justifica: “Ladeiras eu não subi/ Não tive o mar pra olhar/ Mas tenho Cartola, Vinícius, Ari, Pixinguinha e Noel na vitrola...”), a herança de cacoetes djavanescos de “Verdade”, e a autocrítica interrogativa de “Do Glória” (Será que nessa terra tem carnaval?/ Será que nosso samba é original?), antes de fechar a lista com “Um Sambinha”, numa óbvia referência à sua relação íntima com a tradição, acompanhando os registros mais suaves de sua voz com o dedilhado polido do violão de João Garoto.


E se, no geral, o resultado das canções soa muito calculado, quase protocolar, a falta de atrevimento é compensada pelo cuidadoso acabamento instrumental, que fornece o encaixe exato para as ondulações de sua voz, numa lei da compensação que, noves fora, ainda garante um quociente bastante favorável.






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